REDES

quinta-feira, 1 de maio de 2025

Ensaio de Tempo de Jose Edmilson Rodrigues

 

                                                        EDITORA PATUÁ


                                                   Jose Edmilson Rodrigues   -Coleção do autor

Aqui destaco o  livro do poeta  Jose Edmilson Rodrigues - ENSAIO DE TEMPO,  em  crítica e ou apresentação  da poeta Selma  Vasconcelos. Sua apreciação é  farta e apura traços do poeta José Edmilson, resultando num quase ensaio, face seu tricotear por variáves diversas da Literatura e campos epistêmicos vizinhos,isto é uma atîtude bem ladrilhada que uma boa crítica tece ao aceitat esta tarefa.

Paulo Cordeiro Vasco


A propósito do livro Ensaio de Tempo de Jose Edmilson Rodrigues


Selma Vasconcelos*


A inexatidão de definir ou conceituar o que seja o tempo, talvez explique a preocupação

recorrente de pensadores , filósofos e poetas em torno desse “ motor “ contínuo que aprisiona

nossas vidas. Para nós, ocidentais, que adotamos o calendário gregoriano, a passagem do

tempo é dimensionada e baseada na posição da terra em relação ao sol. Dividem-se os anos

em 365 dias o que corresponde ao tempo em que a terra completa uma orbita ao redor do

astro rei.

As culturas ancestrais, como as indígenas registram o tempo de acordo com fenômenos

naturais; a cultura islâmica adota o calendário lunar , ou seja, considera um ciclo lunar

completo que dura 29 dias , resultando em anos de 354 dias .Portanto os calendários refletem

as necessidades de organização social de cada cultura em especial.

Mas o que nos interessa nesse artigo é demonstrar a preocupação humana com esse ser

fluido, impalpável , que nos acompanha e nos marca ao longo de nossa trajetória passageira

pela terra. Os poetas, particularmente , não raro, trazem à luz essa inquietação .

Como bem referiu Edmilson em seu poema João e outros em si, dedicado a João Cabral de

Melo Neto “ João é íntimo e não intimista”. O autor vai adiante numa das melhores definições

do poeta pernambucano: Carpinteiro das palavras. Dessa carpintaria de João Cabral ,

poderíamos trazer, por exemplo ,o poema Relógio. A estrutura do poema faz coerência com a

estrutura de um relógio, desde que é todo regido pelo número quatro. São quatro partes ,

cada parte com seis estrofes de quatro versos; idêntica portanto á estrutura de um relógio que

traz em cada uma de suas metades seis números tendo sua circunferência dividida em quatro

quadrantes .

A partir daí o poeta denota sua preocupação com esse quantificador de nossas vidas. Como é

característico à poética cabralina, ele trabalha em seu tear um tecido de metáforas sempre

objetivando chegar a uma imagem mais precisa do objeto que estuda. Inicialmente compara o

tal relógio a uma gaiola, ou seja, um elemento escravizador que aprisiona o tempo e em

decorrência , escraviza o homem. Por outro lado, como toda gaiola, aprisiona um pássaro

cantor ( a gaiola será de pássaro ou pássara/ é alada sua palpitação....) Mais adiante

diferencia esse “ pássaro por ter um compasso “ humana, mas de máquina horizontal e

monótono...simplesmente trabalho, não de mão, sem fadiga e por demais precisa”, e aprisiona

o tempo que é seu combustível . No final do poema o poeta humaniza sua metáfora fazendo

alusão `a outra “máquina” ... outra máquina de dentro ...soando no fundão das veias, e que “

revela vontade própria”, ou seja ,como ele próprio diz “ coração , noutra linguagem”. No caso,

esse mecanismo humanizado é que move os ponteiros até que se esvaia o tempo.

Na verdade ,esse poema é um belo exemplo do que sempre norteou a poética de João Cabral

que à maneira de PENÉLOPE constrói e descontrói o objeto até que se possa desvendá-lo em

continuo exercício de inteligência a duas mãos, autor e leitor.


A poesia de José Edmilson Rodrigues não se faz diferente . A partir do titulo do livro “ Ensaio

de tempo “ o autor denuncia sua inquietação com essa máquina alimentada por outra que é

nosso coração “ a máquina de dentro “ como disse João Cabral.

Vejamos o poema do poeta campinense: Outra vez –ele aponta para o amor antigo que se foi

““na pista do vento / que o tempo marca e apaga”,

Continuando nosso deleite na leitura chegamos ao poema Quando falamos de ontem; aqui o

poeta declara seu espanto diante da passagem do tempo e suas marcas no rosto da mulher

amada; mas recompõe sua figura, a despeito da voracidade do tempo , num exercicio mágico

que só o gênio criador permite , a face procurada “ era ontem como o mesmo sorriso”.

No poema Ensaio de tempo que dá título ao livro, o poeta faz uma alusão clara à dualidade e

temporalidade da vida: “Nós somos a casca do madeiro e o ar que sobre ele resvala”.

Esse poema me remete a outro poeta, o nosso Mário Quintana ,no poema de título quase

idêntico , em versos magistrais:

O TEMPO

...E se me dessem um dia uma outra oportunidade

Eu nem olhava o relógio, seguia sempre em frente

E iria jogando pelo caminho

A casca dourada e inútil das horas

Como disse Antônio Candido a respeito de João Cabral: “não era um poeta em paz”. Repito

essa assertiva a respeito de Jose Edmilson Rodrigues Ele também não é um poeta em paz

,muito embora sua inquietude nos proporcione leituras provocadoras e inteligentes .


Recife, 12/04/2025

*SELMA VASCONCELOS - Paraibana,Professora, médica, escritora. Poeta biógrafa de João Cabral M. Neto. Cronista, crítica do cotidiano..Obras publicadas dentro e fora do país com prêmios nacionais e internacionais



Nenhum comentário: